segunda-feira

Gafas Nhoto

O circo Degredus chegou finalmente a Anarquim!
Palhaços, trapezistas, araras pernetas, macacos azuis, leopoldinas, ursos polares, e finalmente, a estrela da companhia: o grande Gafanhoto Erudito.
Poucos o sabem, mas fui em quem descobriu o Gafas ( era assim que carinhosamente o chamava quando lhe dava banho com água oxigenada). Tudo começou numa fria tarde de Outubro.
Recordo-me como se fosse antes de ontém...Caminhava para a diocese, onde ia diariamente buscar a PPAFSUCSPCUPDUMDP (Pensão Para As Familias Sem Um Chavo Sequer Para Comprar Uma Puta De Uma Migalha De Pão), quando encontrei o pequeno gafanhoto, lutando desesperadamente para se escapulir de uma enorme poça de lama. Assim que o vi, senti algo que não pensei ser possível de sentir quando se olha para um animal deste calibre : Fome.
Passaram então vinte e três segundos entre a chegada desta sensação e a saciação da mesma. Foi o tempo de pegar no Gafas por uma pata, passá-lo por água limpa (não aprecio lama em insectos, mas gosto de a barrar em pão de forma duro. Quer dizer, duro porque nunca comi mole...Se já tivesse comido pão do dia se calhar gostava mais. Mas até gosto dele duro. É gostoso. Quer dizer, gostoso gostoso não é, mas com lama marcha que nem ginjas.), e colocá-lo na boca.
Segui-se a fase de transformação do Nhoto (nome pelo qual o comecei a chamar mais tarde sempre que se portava mal) em bolo alimentar. Este processo é extremamente agradável para quem petisca estes espécimes, uma vez que a própria textura estaladiça do animal e os inúmeros sucos de paladar apurado que dele se desprendem, transmitem uma incomparável sensação de bem estar.
Uma vez culminada esta transformação, o mais incrivel dos fenómenos aconteceu: senti uma espécie de implosão dentro da minha boca ( implosão essa que acabou por vitimar dois dos meus oito dentes). Para espanto meu, ao abrir a boca deparei-me com o gafanhoto completamente intacto, a tocar percussão com os seis dentes que me restavam.
Na altura, inocente como era, corri para casa e fiz uma demonstração deste deslumbrante espectáculo para a minha familia.

Menosprezei porém o facto de que isso implicaria a queda de mais dois dentes. Ficaram então apenas quatro exemplares de molares na minha boca. Mas o meu infortunio não podia ficar-se por aqui. É óbvio que faltava a intervenção da mãe em toda esta história: um murro nas fussas, por fazer sofrer o bicho divino. Resultado : Fiquei sem dentes!

Ora, não tendo dentes, o Gafas deixou de ter percussionismo na minha boca. Decidi então doá-lo ao circo Degredus, onde foi acolhido como uma verdadeira vedeta.
E é vê-lo hoje em dia a brilhar nas suas actuações, juntamente com um misterioso duende albino, ao qual crescem dentes novos todos os dias.

Joel, 27 de Junho de 1970, Anarquim de Baixo.

3 comentários:

tixa disse...

naaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaoooooooooooooooooo é possível!!!!!!!!!!!!

Anónimo disse...

um brinde ah tua genialidade morbida !

Anónimo disse...

epa foda-se... sinceramente...cum caralho.... hei.....